Estratégias e desafios para um mundo ‘net zero’ e ‘carbono neutro’

Imagen de uma pequena casa no topo de uma colina bem verde e rodeada de árvores e placas solares e turbinas eólicas sob um céu azul ilustram o artigo que fala sobre estratégias e desafios para um mundo “net zero” e “carbono neutro”.
Para alcançar a neutralidade de carbono será preciso um compromisso global que envolva a colaboração entre governos, setor privado e sociedade. Imagem: Rosy Bad Homburg/Pixabay. Editada por Sustenare.
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Existe uma dúvida recorrente sobre as diferenças entre “net zero” e “carbono neutro”. Um relatório do think tank NewClimate Institute sugere que na prática ambos os termos são usados de forma permutável, mas tecnicamente eles possuem definições diferentes. De forma simplificada, “carbono neutro” refere-se às emissões líquidas zero somente do dióxido de carbono (CO2), enquanto que “net zero” diz respeito às emissões líquidas zero de todos os gases de efeito estufa (GEEs).

A expressão net zero pode ser usada como uma forma de representar a quantidade de emissões de GEEs que deve ser lançada na atmosfera para manter o aumento da temperatura média global dentro do limite de 1,5 °C até 2030, conforme estabelecido por quase 200 nações que participaram do Acordo de Paris, em 2015.

evidências científicas de que as atividades antropogênicas (decorrentes da ação humana), como o consumo de combustíveis fósseis no transporte e na geração de energia, ou a queima de gás e carvão em processos industriais e também para aquecer residências, contribuem de forma considerável para o aquecimento global.  De 1970 a 2010, por exemplo, a queima de combustíveis fósseis nos transportes e em atividades industriais contribuiu com 78% para o aumento total dos GEEs.

A concentração atual de CO2 de origem antropogênica está 50% mais alta na atmosfera do que no período anterior à Revolução Industrial. Em 16 de fevereiro de 2024, a concentração de CO2 ultrapassou a marca de 423 PPM (ou seja, 423 moléculas de CO2 para cada milhão de moléculas de ar), segundo dados da NOAA – National Oceanic and Atmospheric Administration.

O Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, da ONU, diz que as concentrações dos principais GEEs já alcançaram limites preocupantes:

423 PPM (Partes Por Milhão) para o CO2, em fevereiro de 2024

1.933 PPB (Partes Por Bilhão) para o metano (CH4): em outubro de 2023

336 PPB para o óxido nitroso (N2O): em outubro de 2023

Esses limites fazem com que na década corrente seja preciso reduzir quase que pela metade as emissões de GEEs. Isso se quisermos ter qualquer chance de manter o limite de aquecimento global em 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais, como forma de evitar os piores impactos climáticos, sugere o PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

Obviamente, o ideal é que as emissões sejam zero, mas isto nem sempre será possível. Quando este for o caso, as emissões remanescentes terão que ser compensadas (offset) ou removidas da atmosfera.

Como compensar ou sequestrar o carbono

A compensação de carbono (carbon offseting) pode ser feita por ações de reflorestamento ou mediante o plantio de árvores, por exemplo, porque as árvores absorvem e estocam o CO2 enquanto crescem, embora o espaço livre possa não ser suficiente para a quantidade de árvores que precisam ser plantadas.

Além disso, a compensação de carbono apresenta outras limitações e desafios, como garantir a qualidade, transparência e permanência dos projetos de compensação, abrir uma brecha para que empresas a utilizem como greenwashing de produtos e por não ser uma solução definitiva.

Já o sequestro (captura) e armazenamento de carbono podem acontecer de forma natural, via absorção pela superfície dos oceanos ou pelo uso de tecnologias que possam estocá-lo em formações de armazenamento geológico como, por exemplo, aquíferos salinos profundos e rochas basálticas.

Alternativamente, o sequestro de carbono pode acontecer por meio de tecnologias que se encarreguem de fazer sua remoção do ar (DAC) e submetê-lo a um processo de solidificação, para depois ser enterrado ou depositado no fundo do oceano. Entretanto, algumas tecnologias existentes ainda são novas, caras e passíveis de comprovação.

Imagem de uma DAC renderizada por computador. Crédito: Climeworks/Reprodução.

Tanto a compensação como a captura de carbono são estratégias valiosas e voltadas para a mitigação das emissões de CO2. Assim, elas devem continuar sendo aprimoradas para que possam somar esforços no combate ao aquecimento global, embora não devam ser vistas como soluções únicas para isso.  E mesmo porque o CO2 não é o único gás causador do aquecimento global. O metano também é – só para ficar nos dois piores.

Principais vilões do aquecimento global

Apesar de o CO2 ter um potencial de aquecimento bem menor do que o do metano, aquele demora muito mais tempo na atmosfera (100–270 anos) do que este (em torno de 12 anos). Por este e outros motivos o CO2 é considerado o principal vilão do aquecimento global. De qualquer forma, o metano também é considerado um gás muito poderoso de efeito estufa.

Segundo uma publicação do Massachusetts Institute of Technology (MIT), se for considerado como base um período médio comparativo de 100 anos, o metano tem um poder para aquecer o clima de 25–28 vezes maior do que o do CO2, apesar de ser cerca de 200 vezes menos abundante na atmosfera do que o dióxido de carbono.

Como o principal ingrediente do gás natural (que tem origem fóssil), o metano – que também é gerado pela decomposição de matéria orgânica – pode ser capturado de aterros sanitários e usado para produzir eletricidade, aquecer prédios e mover caminhões de lixo, segundo a EPA, Agência de Proteção Ambiental americana.

Na agricultura, a fermentação entérica de ruminantes resulta numa quantidade grande de metano e por isso ela é considerada um fator que contribui para as mudanças climáticas.

Enquanto buscamos alcançar metas ambiciosas para a neutralidade do carbono, é fundamental reconhecer e enfrentar os principais vilões do aquecimento global, como o CO2 e o metano. E à medida que exploramos as diferenças entre “net zero” e “carbono neutro”, e identificamos tais vilões, fica claro que para mitigar os impactos do clima será necessária uma abordagem abrangente que permita reduzir drasticamente as emissões de GEEs.

Enquanto fazemos um esforço para entender e adotar estratégias que sejam eficazes para reduzir tais emissões, é essencial reconhecer a urgência para um compromisso global – que envolva a colaboração entre governos, setor privado e a sociedade como um todo – no combate às mudanças climáticas. Dessa forma, será possível pavimentar o caminho para que as próximas gerações possam ter um futuro sustentável e resiliente.

Sobre o autor | Fernando Oliveira


Fernando é o fundador e editor da Sustenare News. Ele é administrador de empresas, cientista da computação e doutor em energia pela Universidade de São Paulo (USP). Fernando morou nos Estados Unidos por dez anos, país onde cursou universidade e trabalhou por igual período para empresas de tecnologia e do ramo editorial.

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