O pessimismo climático da mídia é uma narrativa ruim
Toda vez que notícias sobre o clima são publicadas, como o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, manchetes assustadoras como “alerta final” ou “agora ou nunca” costumam ser a norma. Alguns ativistas chamam essa abordagem de “pessimismo climático”. Eles são rápidos em criticar tais publicações porque o pessimismo climático da mídia é uma narrativa ruim, pois representa a visão de que a humanidade perdeu a batalha do clima – e não sentimos nada além de desamparo e ansiedade por isso.
Em uma extensa pesquisa global, cujos resultados foram publicados em 2021, 10.000 crianças e jovens (entre 16 e 25 anos) compartilharam seus sentimentos sobre o meio ambiente. Os resultados foram surpreendentes: do Brasil à França, da Nigéria ao Reino Unido, pelo menos 84% disseram estar moderadamente preocupados com as mudanças climáticas e 59% disseram que estavam muito ou extremamente preocupados.
Qual o propósito em assustar alguém que já está com medo? A forma como compartilhamos as informações pode afetar muito o modo como as pessoas se envolvem com elas.
A resposta biológica do “lutar ou fugir” se aplica à forma como respondemos às informações, inclusive quando damos uma navegada pelas notícias. Pesquisas mostram que o medo aumenta o impacto de uma informação. Aguça todos os nossos sentidos – e devemos reagir. Contudo, sem instruções claras sobre como canalizar essa energia, é mais provável que tentemos evitar as informações.
Na década de 1960, psicólogos sociais da Universidade de Yale [nos EUA] conduziram um experimento sobre o impacto que histórias assustadoras exerciam na tomada de decisão. Foi pedido a um grupo de alunos que lesse um livreto sobre os riscos da infecção por tétano – e então perguntaram aos participantes se eles gostariam de ser vacinados contra isso.
Havia quatro versões do folheto transmitindo diferentes níveis de medo em suas descrições da doença e estudos de caso de pacientes. Alguns tinham recomendações mais específicas sobre onde obter a vacina.
O experimento revelou um alto nível de medo, preocupação e até náusea naqueles que se envolveram com a versão mais dramática do texto. Ótimo, pensaram os pesquisadores, esses alunos assustados certamente serão vacinados.
No entanto, a maioria dos alunos não se preocupou em ir ao posto de vacinação bem perto. Porém, 15% o fizeram, pois leram a variação do folheto que continha instruções diretas para a ação. Eles souberam encontrar o posto de vacinação, viram um mapa, horário de funcionamento e um lembrete de que a vacina era gratuita. Este e outros estudos mostram que o medo pode nos desgastar, a menos que tenhamos instruções claras sobre como agir.
Transformando a esperança em ação
Eu tenho estudado sobre o jornalismo viral e sobre os esforços dos jornalistas para fazer as histórias se espalharem pelas mídias sociais e atrair os leitores online. Identifiquei uma série de gatilhos que os profissionais usam para manter os leitores envolvidos com uma história.
As emoções de admiração, raiva e ansiedade ativam as pessoas para curtir, clicar, comentar e compartilhar. Como disse um entrevistado, as reações “LOL, WTF e OMG” resultam em um clique “garantido”. Quando a história é muito triste, no entanto, ela “desativa” os leitores, tornando-os mais propensos a se retirar, ficar quietos e não compartilhar ou não clicar muito.
Há outras maneiras que são melhores no sentido de motivar as pessoas a agir do que o pessimismo das mudanças climáticas usado por algumas mídias sociais. Antes de compartilhar um link ou postar no “story” do Instagram, aqui estão algumas sugestões para lembrar.
1. Ajude as pessoas a se verem
Descobri em minha pesquisa que uma maneira fácil de tornar uma história viral é o giro da identidade. Quando o assunto de uma história se assemelha à identidade dos leitores (por exemplo, pai, aluno, filho ou filha), os leitores podem “ver a si mesmos” e se conectar mais com a história.
Pense em quem você deseja alcançar com sua postagem. Ou seja, um texto sobre um estudante universitário de 20 anos sofrendo muito com o calor excessivo relacionado às mudanças climáticas provavelmente atrairá a atenção de outros universitários, em vez de um artigo mais genérico sobre “um londrino”.
Uma história dando conselhos sobre como lidar com a ansiedade ecológica, que usa imagens de mulheres da Geração Z, pode ser boa para compartilhar com outras mulheres desse mesmo grupo demográfico.
2. Compartilhe pequenas soluções
Albert Bandura – psicólogo de renome mundial – explicou que as pessoas ganham confiança e desenvolvem habilidades por meio de pequenos passos. Uma vez que alcançamos uma pequena coisa, nos sentimos fortalecidos para ir mais alto e almejar ainda mais nosso objetivo; isso se chama auto eficácia.
O conceito também pode ser aplicado à ação climática. Olhar para soluções individuais pode parecer trivial, mas é uma ótima maneira de aproveitar o poder da auto eficácia. Considere compartilhar informações que ajudem as pessoas a concluir as etapas atingíveis, como fazer comprar coisas de segunda mão, reciclar mais, mudar sua dieta e votar em políticos que levam a sério o combate às mudanças climáticas.
3. Mantenha-se positivo
Pesquisas mostram que imagens e histórias de conquistas e soluções ajudam a gerar sentimentos de auto eficácia nos leitores. As pessoas são mais propensas a mudar de comportamento depois de ver painéis solares em matérias da mídia, em vez de fumaça saindo da chaminé de uma fábrica.
Sejam vocês jornalistas, ativistas ou apenas usuários regulares de mídia social, é mais provável que vocês compartilhem histórias positivas – que abordem desenvolvimentos verdes positivos – em vez de pessimistas.
Artigo original (em inglês) publicado por Anastasia Denisova na The Conversation.
Sobre a autora
Anastasia Denisova é professora sênior de jornalismo na Universidade de Westminster. Ela possui doutorado em mídias sociais e pesquisa memes da Internet, narrativa viral e o papel da comunicação digital para a deliberação política.
Nota: Anastasia Denisova não trabalha, não faz consultoria, nem possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que se beneficie deste artigo – e não divulgou afiliações relevantes além de sua nomeação acadêmica.A Universidade de Westminster fornece financiamento como membro do The Conversation UK.
Imagem no início do texto: cortesia Freepik.