População mundial atinge 8 bilhões. No que isso implica?
A população mundial acaba de bater um novo recorde: 8 bilhões. Como de costume, há debates acirrados sobre a chamada “capacidade de carga” que o planeta suporta – ou seja, o número total de pessoas que podem viver na Terra de forma sustentável. Os especialistas geralmente se dividem em dois campos: há os que defendem que precisamos reduzir drasticamente a população humana para evitar uma catástrofe ecológica. E há aqueles que acreditam na tecnologia para encontrar soluções inteligentes sem necessariamente ter que enfrentar o problema de frente.
Os cientistas já debatem essas questões demográficas pelo menos desde o século 18, quando o economista britânico Thomas Malthus publicou “Um Ensaio Sobre o Princípio da População”, sem dúvida o primeiro tratado global voltado para a relação entre crescimento populacional e escassez.
Algumas décadas depois, no entanto, a Revolução Industrial (que Malthus não conseguiu antecipar) introduziu o mundo em uma era de abundância, relegando as previsões sombrias que ele fez sobre a inevitabilidade da escassez à margem do debate científico.
O professor de Stanford Paul Ehrlich traz o assunto de volta em seu livro best-seller “The Population Bomb”, publicado no final dos anos 1960, em que ele defende uma ação imediata para limitar o crescimento populacional em um planeta finito.
A recomendação de Ehrlich foi reiterada alguns anos depois pelo Clube de Roma – rede internacional de cientistas e industriais – que em 1972 publicou o relatório “The Limits to Growth”, no qual demonstra apropriadamente a relação dinâmica entre o aumento do consumo e a ideia de “fronteiras planetárias” que não podem ser cruzadas sem que haja risco de uma mudança ambiental severa.
É verdade que algumas tecnologias tornaram a produção mais eficiente (pense nos fertilizantes), pois aliviaram o impacto do crescimento populacional quanto ao uso de recursos. Mas pouca dúvida permanece de que a raça humana ultrapassou bastante os limites seguros do espaço operacional de seis dos nove domínios planetários, conforme mostra o gráfico acima.
Uma população menor ainda pode ser mais destrutiva
No entanto, é difícil estimar quantos seres humanos o planeta pode suportar de forma sustentável. Isso geralmente é negligenciado nos debates sobre políticas, que geralmente lidam com a questão de maneira bastante simplista, baseando-se na suposição de que o aumento dos padrões de vida produzirá taxas mais baixas de natalidade. Portanto, continua o argumento de que a população global diminuirá assim que continentes como a Ásia e a África atingirem níveis de desenvolvimento semelhantes aos da Europa e da América do Norte.
A falácia aqui é assumir que apenas a tecnologia e a população são importantes. Hoje em dia, os cientistas ambientais na maioria das vezes concordam que o impacto geral também é uma função da riqueza (a chamada equação I=PAT). Isso pode facilmente gerar um paradoxo. Os países continuam aumentando seus padrões de vida e o consumo per capita, resultando em populações menores, mas impactos ecológicos muito maiores.
Veja o caso da China. As taxas de crescimento populacional naquele país que na década de 1970 eram de 2,8%, tiveram este ano seu primeiro declínio em termos absolutos. Entretanto, durante esse mesmo período, os níveis gerais de consumo do país aumentaram enormemente, resultando em um impacto líquido muito pior. O mesmo se aplica à Índia e à maioria das economias emergentes e em desenvolvimento. Se essa tendência continuar, podemos acabar com uma população global menor, mas com efeitos significativamente mais destrutivos ao planeta.
Desenvolvendo uma “economia do bem-estar”
Chegou a hora de repensar nossa abordagem com relação à riqueza e desenvolver maneiras diferentes que possam melhorar os padrões de vida. Em um novo relatório para o Clube de Roma, intitulado Earth4All, argumentamos que os países (em especial os mais industrializados) devem substituir a busca pelo crescimento econômico por medidas mais amplas de bem-estar social e ecológico. Isso resultaria numa queda significativa do consumo de material, sem prejudicar a qualidade de vida em geral.
O que isso significa na prática? As políticas devem aperfeiçoar o uso e a eficiência energética, além de incentivar um melhor equilíbrio entre vida pessoal e profissional e a igualdade de gênero, pois o empoderamento das mulheres é um fator determinante do crescimento populacional.
Também precisamos de práticas regenerativas e soluções caseiras para fabricação e produção de alimentos (cerca de 30% dos alimentos a nível global são perdidos ou desperdiçados por conta do consumo excessivo e padrões estéticos).
Essa abordagem de “economia do bem-estar” ajudaria todos os países (incluindo os mais pobres) a saltar para um tipo diferente de desenvolvimento, capaz de combinar alta qualidade de vida com impactos ambientais muito limitados. É a diferença entre uma economia extrativa e linear que transforma recursos em emissões e uma economia circular regenerativa que não produz resíduos porque a saída de qualquer processo torna-se a entrada de outro.
Há um enorme espaço para melhorias. Afinal, a maior parte do nosso bem-estar não depende do consumo material (acima de um nível mínimo suficiente), mas da qualidade de nossas relações sociais e do ambiente em que vivemos. Em última análise, viver melhor e com mais equidade nos ajudará a encontrar o equilíbrio certo também em termos de população global, sem a necessidade de impor restrições.
Artigo original (em inglês) publicado pela The Conversation.
Sobre os autores
Nota: Os autores não trabalham, não são consultores, nem possuem ações ou recebem financiamento de qualquer empresa ou organização que se beneficiem deste artigo, e não divulgaram nenhuma afiliação relevante além da acadêmica.
A Universidade de Surrey e a University College London (UCL) fornecem financiamentos como membros do The Conversation UK.