Dessalinização pode ser a chave para escassez global de água
A água doce e limpa é fundamental para sustentar a vida humana. Apesar disso, 1,1 bilhão de pessoas em todo o mundo ainda não têm acesso a ela. A dessalinização representa uma maneira cada vez mais popular de resolver esse problema.
A dessalinização é o processo de extração do sal presente na água do mar para torná-la potável. Existem dois tipos principais de dessalinização.
No primeiro – chamado de dessalinização térmica – o calor é usado. Isso produz vapor de água que se condensa nos canos para virar água doce. Esse processo permanece dominante em todo o Oriente Médio, região na qual se produz quase metade de toda a água dessalinizada no mundo.
O segundo processo é a dessalinização por membrana, comumente chamada de osmose reversa. Este processo é utilizado em 60% das usinas em todo o mundo. A água salina é forçada sob alta pressão através de uma membrana semipermeável cujos poros são pequenos demais para a passagem das moléculas de sal.
Onde a dessalinização é usada?
A dessalinização é usada para aumentar a oferta de água potável para além do que normalmente está disponível. Portanto, as regiões que mais sofrem com a escassez de água são particularmente as mais dependentes da tecnologia. Nos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, 42% de suas necessidades de água são atendidas pelo processo de dessalinização.
Por conta de seu custo mínimo de bombeamento, a dessalinização é mais econômica em grandes regiões costeiras. No entanto, a mudança de nosso clima está contribuindo para aumentar a escassez de água em regiões tipicamente amenas, demandando a expansão de usinas de dessalinização mais para o interior – e de água salobra. A China, os EUA e a América do Sul estão expandindo suas capacidades de dessalinização.
Embora a dessalinização possa ser uma tecnologia capaz de combater a escassez global de água, há problemas em relação ao seu custo e eficiência.
Por que a dessalinização continua tão cara?
O principal motivo recai nas grandes quantidades de energia necessárias para conduzir o processo. Isso é particularmente verdadeiro para a dessalinização térmica, na qual os custos energéticos representam até metade do custo total de produção de uma usina.
O processo de osmose reversa geralmente requer uma necessidade menor de energia. Porém, o tratamento de água altamente salina ainda continua sendo intensivo em energia por conta da maior salinidade que, por sua vez, demanda mais pressão para forçar a água através da membrana.
As fontes de água altamente poluídas também devem ser tratadas antes da dessalinização, exigindo infraestrutura cara, como tanques de sedimentação e sistemas de filtragem. O tratamento evita o acúmulo de detritos nas superfícies da membrana que podem impedir o processo de osmose reversa.
Os custos de tratamento aumentarão na medida em que a dependência da dessalinização aumentar e o processo for aplicado a fontes de água poluída e salobra. Na Califórnia, estado americano cujo clima está cada vez mais seco, existem 23 usinas de dessalinização que transformam água salobra em água potável.
Na dessalinização, a produção de um litro de água potável também gera 1,6 litros de salmoura, considerado um resíduo altamente salino que pode prejudicar o meio ambiente. Enquanto a descarga de salmoura reduz o teor de oxigênio da água do mar, os depósitos de salmoura no fundo dos oceanos podem destruir os ecossistemas marinhos.
O descarte seguro de salmoura é caro, a maior parte da que é produzida é bombeada de volta ao mar, e está sujeita a padrões de qualidade ambiental. Se a descarga de salmoura não atender a esses padrões, um tratamento adicional será necessário.
A salmoura pode ser tratada em lagos de evaporação ou diluída com uma fonte de água separada antes de ser descartada. O custo proibitivo do tratamento com salmoura continua sendo uma barreira significativa para a aplicação mais ampla da dessalinização.
A dessalinização pode se tornar mais barata?
A redução da intensidade energética do processo de dessalinização pode resultar em consideráveis reduções de custos. Tecnologias como osmose direta, que permitem que a dessalinização ocorra em temperaturas e pressões mais baixas, estão em desenvolvimento.
Embora promissoras, essas tecnologias permanecem no estágio inicial, o mercado é pequeno e existem poucas instalações comerciais. A evolução tecnológica leva tempo e serão necessários mais desenvolvimentos para garantir que esses processos possam produzir água potável em escala comercial.
O desenvolvimento de membranas mais duráveis também reduzirá o custo da dessalinização. Usando diferentes materiais, fabricantes japoneses construíram membranas que rejeitam com sucesso partículas de sal em baixas pressões operacionais. Isso reduz o custo de substituição de membranas e a necessidade de energia do processo.
A dessalinização também poderia ser alimentada por fontes mais baratas de energia renovável. As tecnologias solares térmicas podem gerar calor direto, que pode ser usado para evaporar a água do mar. A usina de dessalinização solar Metito – em construção na Arábia Saudita – terá inicialmente a capacidade para produzir 30.000 metros cúbicos de água potável por dia.
No entanto, a tecnologia de dessalinização solar está repleta de complexidades. O fornecimento de energia solar é inconsistente e a tecnologia de armazenamento de energia continua cara, impedindo sua aplicação mais ampla. Portanto, a maioria dos projetos de dessalinização solar é muito pequena para produzir água potável de uso comercial.
Novas soluções para o gerenciamento de salmoura também devem ser exploradas.
A salmoura pode ser reciclada dentro do processo de dessalinização. O uso de salmoura residual na fabricação de hipoclorito de sódio, um desinfetante químico que pode substituir o cloro, é um desenvolvimento promissor.
A pesquisa mostrou que a produção de hipoclorito de sódio no local pode economizar mais de 300 mil libras esterlinas por ano nas usinas de dessalinização do Caribe.
As instalações de dessalinização podem explorar ainda mais a salmoura residual por meio de processos como a eletrólise, no qual a salmoura é decomposta em substâncias mais simples por meio de correntes elétricas. Futuros estudos devem investigar o potencial de utilização dos subprodutos desta eletrólise, hidrogênio e sais, para produção de energia.
Apesar da crescente insegurança hídrica em todo o mundo, a tecnologia de dessalinização continua cara demais para que possa ser usada de forma mais generalizada. Esforços foram feitos para reduzir seu custo – muitos se mostrando promissores. No entanto, a evolução tecnológica leva tempo e pode levar décadas até que os custos caiam a um nível que resulte numa maior expansão do processo de dessalinização.
Artigo original (em inglês) publicado por Kiran Tota-Maharaj na The Conversation.
Sobre o autor
Kiran Tota-Maharaj é Ph.D. pela Universidade de Edinburgh, mestre em Engenharia Ambiental pela Universidade New Castle e bacharel em Engenharia Mecânica pela Universidade West Indies. Ele atua na área de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Universidade Aston Birmingham e é membro da Sociedade Americana de Engenheiros Civis. Ele também é Professor Visitante no Instituto Gandhinagar (Índia) e Pesquisador Sênior na Universidade de Tampere (Finlândia).
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Nota: Kiran Tota-Maharaj não trabalha, consulta, possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que se beneficiaria deste artigo e não divulgou afiliações relevantes além de sua nomeação acadêmica.
A Aston University fornece financiamento como membro do The Conversation UK.