Mineração e processamento de lítio para EVs contaminam a água

Foto aérea de uma usina de energia geotérmica ilustra o artigo intitulado: Mineração e processamento de lítio para EVs contaminam a água
Em Salton Sea, na Califórnia, as usinas geotérmicas em breve também poderão extrair lítio da água salgada contida nas profundezas do solo. Mas ambientalistas e membros da comunidade regional se preocupam com os impactos que a mineração terá no abastecimento local de água. Crédito: WikiImages/Pixabay.
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Um novo estudo descobriu que a mineração e o processamento de lítio – metal crítico para as baterias de veículos elétricos e projetos de armazenamento de energia renovável – esgotam e contaminam a água, muitas vezes em comunidades já vulneráveis, de acordo com um novo artigo publicado recentemente.

Desde a mineração do lítio até seu processamento para uso em baterias, a água é essencial para a produção do metal macio e prateado com capacidade superior para manter uma carga. Com a demanda por lítio aumentando enquanto o mundo se afasta dos combustíveis fósseis que aquecem nosso planeta, os pesquisadores examinam cada vez mais os impactos ambientais da extração e uso desse mineral crítico para a transição energética.

Um novo artigo, intitulado Lithium and water: Hydrosocial impacts across the life cycle of energy storage, foi concebido como uma cartilha para membros da comunidade, ativistas e outros pesquisadores sobre o impacto do lítio no abastecimento de água. Isso deixa a situação clara – os produtos de lítio, em todo o seu ciclo de vida, terão “impactos na quantidade e na qualidade dos recursos hídricos” que afetarão principalmente as comunidades que já estão na linha de frente das mudanças climáticas.

“A mitigação [dos impactos causados pelas] mudanças climáticas às vezes pode tornar ainda mais difícil para as sociedades e ambientes que já estão sob estresse extremo se adaptarem a tais mudanças”, disse James Blair, professor-associado de geografia e antropologia da Universidade Politécnica do Estado da Califórnia, que liderou o estudo. “Em lugares que sofrem com a seca ou calor extremo que são estressores climáticos significativos, precisamos estar realmente cientes dos problemas de abastecimento de água que estão envolvidos em algumas das indústrias que devem apoiar uma transição energética”.

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas está preocupado com a má adaptação – esforços para lidar com o aquecimento global que têm consequências não intencionais e prejudiciais ao meio ambiente. A mineração de minerais críticos para a transição energética está na frente e no centro das comunidades locais, disse Blair.

Virá da mineração o maior impacto na água decorrente do desenvolvimento de energia renovável

A mineração de rochas duras, que fornece 63% do suprimento mundial de lítio, requer grandes quantidades de água e esforços intensivos de mitigação para evitar a contaminação do abastecimento local. Em Thacker Pass, Nevada, por exemplo, uma nova mina de lítio a céu aberto, atualmente em construção, usará 1,6 bilhão de galões de água a cada ano de sua vida útil de 41 anos, sugere o artigo. Isso é água suficiente para 53 mil americanos.

“Apesar dos esforços para apresentar a mineração de lítio como uma forma nova e inteligente de mineração para o clima, em sua forma mais básica, a mineração de lítio a céu aberto envolve a criação de buracos grandes na Terra que produzem enormes quantidades de rejeitos e impactos duradouros nas paisagens aquáticas”, escreveram os pesquisadores.

Outros métodos de mineração incluem a evaporação da salmoura de lítio usada na América do Sul, onde a água salgada com lítio – localizada nas profundezas da terra – é bombeada para a superfície para que possa evaporar e deixar para trás o mineral. Tal processo pode esgotar esses aquíferos profundos, que muitas vezes estão interconectados com outras reservas de água que são seguras para beber e para outros usos.

Há também a extração direta de lítio (DLE), onde ele e outros minerais são removidos da água salgada que é enviada de volta para o subsolo. Algumas empresas elogiaram esse método emergente como mais sustentável e menos intensivo no uso de água, mas na verdade ele requer grandes quantidades de água doce.

Na Argentina, um dos poucos lugares onde o DLE foi usado em escala comercial, o processo resultou no esgotamento de um rio local, segundo o artigo. E em Green River, Utah, moradores e ambientalistas protestaram contra um dos projetos DLE que estão mais próximos de entrar em operação no país e sobre seus potenciais impactos no abastecimento de água. O projeto extrairá água do maior afluente do rio Colorado, já esgotado, e os moradores temem que a salmoura tóxica do subsolo possa contaminar o abastecimento de água doce.

A água está no centro da resistência da comunidade em outras partes do país

Na zona rural [do estado americano] de Nevada, onde os poços locais já estão secando, uma proposta de mina de lítio a céu aberto uniu uma comunidade para se opor a ela por temores do que pode acontecer com o abastecimento de água e com um refúgio de vida selvagem local que abriga os peixes mais ameaçados do mundo.

E em Salton Sea (Califórnia), muitas vezes chamada de Vale do Lítio por conta de sua capacidade para fornecer o mineral em [quantidade] suficiente para apoiar a transição energética do país, grupos comunitários locais e ambientalistas entraram com uma ação para tentar impedir uma DLE prestes a entrar em operação. Tais grupos afirmam que as autoridades do condado realizaram um estudo inadequado dos impactos do projeto no abastecimento de água doce da região. Muito do que é necessário para o projeto terá origem no rio Colorado, já em declínio.

“[O artigo] confirma o que temos defendido: não há solução única” para resolver as mudanças climáticas ou a mineração sustentável, disse Jared Naimark, um organizador de mineração da Califórnia, que tem trabalhado com comunidades do Vale Imperial com relação a projetos de lítio e liderado relatórios sobre os impactos locais de uma DLE.

No árido oeste americano, lar da única mina de lítio existente no país e onde muitas outras estão a caminho a água tem sido o fator limitante para o desenvolvimento, disse Dustin Mulvaney, professor de estudos ambientais da Universidade Estadual de San Jose e coautor do estudo.

“Com o desenvolvimento do lítio em Thacker Pass, qual é o problema? Água. Qual é o problema em Salton Sea? Água”, disse Mulvaney. “As indústrias extrativas exigem água e, quando você está desenvolvendo esses projetos em áreas que têm restrições de recursos ou usos concorrentes para esses recursos, inevitavelmente você encontrará algum conflito lá”.

As minas de lítio não precisam estar em terras secas, pois o mineral é encontrado em todo o mundo em uma variedade de ambientes. Mas sua quantidade varia, e a capacidade da produção de lítio para contaminar o abastecimento de água sempre será um problema, disseram os pesquisadores.

Também existem maneiras de minimizar o impacto da mineração de lítio, principalmente reduzindo a quantidade que precisa do mineral, priorizando o transporte público e produzindo EVs menores, revelou a pesquisa. “Às vezes, deixamos algumas dessas energias renováveis fora do gancho livres dos impactos”, disse Mulvaney, mas a única maneira de mitigá-los é prestando atenção.

Artigo original (em inglês) publicado por Wyatt Myskow na Inside Climate News (ICN), uma organização independente e sem fins lucrativos que cobre notícias sobre clima, energia e meio ambiente. Artigo republicado com permissão. Assine a newsletter da ICN aqui.

Sobre o autor
Wyatt Myskow é jornalista e encarregado de escrever sobre seca, biodiversidade e transição para a energia renovável em todo o Oeste dos Estados Unidos. Baseado na cidade de Phoenix, ele já trabalhou para The Arizona Republic e The Chronicle of Higher Education. Wyatt é bacharel em jornalismo pela Universidade Estadual do Arizona.

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