Demanda crescente por eletricidade em data centers preocupa
Usar as tendências econômicas atuais para prever o futuro pode ser enganoso, já que todas as tendências estão sujeitas a limites e contra tendências. Neste artigo, aplicarei essa verdade a uma tendência que tem sido muito comentada: a disparada dos preços da eletricidade nos Estados Unidos – os quais estão subindo mais do que o dobro da velocidade do custo de vida em geral. Continue lendo para entender por que a demanda crescente por eletricidade em data centers preocupa bastante.
O principal fator que impulsiona esses custos é a enorme demanda de eletricidade de mais de mil novos data centers, construídos principalmente para aplicativos de inteligência artificial (IA). Cada data center, dependendo do seu tamanho, requer de alguns quilowatts a até 100 megawatts de energia (o suficiente para atender uma cidade de porte médio).
Apesar disso, a instalação de novos data centers está crescendo a uma taxa superior a 10% ao ano; nesse ritmo, o número total de data centers dobrará em menos de sete anos.
De fato, a Agência Internacional de Energia prevê que a demanda global de eletricidade proveniente de data centers dobrará até o final desta década, quando totalizará mais do que toda a demanda de eletricidade do Japão. A Goldman Sachs Research prevê que 60% desse aumento na demanda será atendido por fontes de combustíveis fósseis.
Demanda por eletricidade em data centers
Para entender por que a demanda crescente por eletricidade em data centers é um problema sério, é preciso mais do que dar uma olhada na sua última conta de luz. A energia não é apenas um dos muitos insumos da economia; na verdade, ela é a própria economia, já que praticamente tudo depende dela.
De toda a energia consumida nos EUA e no mundo, pouco mais de 20% é na forma de eletricidade; o restante envolve a queima direta de combustíveis fósseis. A maior parte da eletricidade também é gerada pela queima de combustíveis fósseis; nos EUA, 60% da eletricidade vem de fontes fósseis — principalmente do gás natural.
A eletricidade não é uma fonte direta de energia, mas um meio de transmissão de energia. Contudo, tanto para residências quanto para indústrias, é uma forma extremamente útil de levar energia aos usuários finais. Basta acionar um interruptor ou apertar um botão e a eletricidade faz algo acontecer. Logo, ela realiza muitas funções para nós, mas seu papel em viabilizar as comunicações e o processamento de dados confere à eletricidade uma importância fundamental na matriz energética da sociedade moderna.
O consumo de energia para processamento de dados e comunicações não costuma aumentar ou diminuir em resposta a mudanças de curto prazo nos preços da energia; os economistas chamam isso de “inelástico”. Portanto, quando os preços da eletricidade disparam, famílias e empresas precisam se ajustar. Como resultado, para as famílias, isso normalmente significa comprar menos produtos de consumo não essenciais; para as empresas, significa aumentar os preços de serviços ou bens. Toda a economia desacelera.
Aumento nos preços da eletricidade pode impactar a economia
Temos um histórico de recessões nos anos de 1973, 1979 e 2008 que estiveram relacionadas ao aumento dos preços dos combustíveis fósseis, impactando toda a economia (veja fotos de filas de carros em postos de gasolina durante a escassez do petróleo nos anos 70). Do mesmo jeito, o que aconteceu com os combustíveis fósseis pode acontecer com a eletricidade: à medida que esta assume um papel central em nosso sistema energético, futuros picos de preços podem ser tão devastadores quanto os embargos de petróleo da OPEP na década de 1970.
A demanda crescente por eletricidade em data centers também representa um problema por conta das mudanças climáticas.
Quase todo o “progresso” da sociedade na redução de emissões ocorreu no setor de geração de eletricidade (por exemplo, o uso de painéis solares em vez de carvão para gerar energia elétrica). Por outro lado, se a demanda por eletricidade crescer rapidamente, isso dificulta o aumento contínuo da participação de energias renováveis na geração da própria eletricidade. Consequentemente, picos de demanda colocam as empresas de serviços públicos em pânico, fazendo com que elas implantem qualquer nova capacidade de geração que consigam obter rapidamente. E até agora, elas estão recorrendo a novas turbinas a gás natural com mais frequência do que a novos projetos eólicos ou usinas solares.
Assim, os data centers podem representar uma ruptura largamente imprevista para um projeto gigantesco que os planejadores de energia chamam de transição energética.
À medida que a sociedade se afasta dos combustíveis fósseis, uma parcela maior do seu consumo energético ocorrerá por meio da eletricidade — que é a energia produzida por painéis solares, turbinas eólicas e barragens hidrelétricas. A transição depende da eletrificação contínua da economia, começando com os veículos elétricos. Com os data centers consumindo tanta eletricidade, torna-se ainda mais difícil distribuir a energia para outros usos e setores, que era o que os planejadores previam. Portanto, os preços da eletricidade não podem continuar subindo indefinidamente. Algo precisa mudar.
O artigo original é bem mais amplo e foi publicado por Richard Heinberg na Resilience.Org – um programa do Post Carbon Institute.
Sobre o autor

Richard Heinberg é membro sênior do Post Carbon Institute e autor de vários livros, incluindo algumas obras fundamentais sobre a atual crise energética e de sustentabilidade ambiental da sociedade. Ele já publicou centenas de ensaios e artigos em periódicos como a Nature e The Wall Street Journal. Sua newsletter mensal, MuseLetter, é publicada desde 1992.
