Empresas fabricantes de celular podem ser mais sustentáveis
Em um mundo digital que está numa evolução vertiginosa, os celulares tornaram-se ferramentas indispensáveis, pois nos conectam com a comunidade global e permitem que tenhamos acesso à informação na ponta dos dedos, entre outras utilidades, tornando nossas rotinas diárias mais fáceis e produtivas. No entanto, a rápida necessidade de trocar os aparelhos de celular, impulsionada por atualizações e substituições frequentes, resulta em consequências negativas para o meio ambiente. Como as empresas fabricantes de celular podem ser mais sustentáveis e diminuir tais impactos ambientais?
Explorarei aqui algumas práticas que as empresas fabricantes de celular podem adotar para criar aparelhos que sejam menos nocivos ao meio ambiente e assim poderem melhorar a pegada ambiental da empresa, bem como reforçar sua imagem perante os consumidores.
Práticas que não são consideradas sustentáveis
Embora alguns fabricantes de celular estejam fazendo esforços para adotar práticas sustentáveis, a indústria como um todo ainda enfrenta desafios em várias áreas que as tornam insustentáveis. A seguir estão algumas práticas comuns que não são consideradas sustentáveis e, portanto, deveriam ser corrigidas.
Obsolescência programada
A “medalha de ouro” da prática insustentável deveria ser atribuída à obsolescência programada. Esta prática perniciosa tem sido adotada por quase todas as empresas fabricantes de celular, que intencionalmente criam seus aparelhos com uma vida útil limitada, muitas vezes por conta de baterias não substituíveis ou porque os fabricantes impedem que o sistema operacional e os aplicativos de seus modelos mais antigos sejam atualizados.
Estou inclinado a considerar que o principal motivo para uma empresa adotar a obsolescência programada de seus aparelhos seja o lucro! Quantos celulares você tem que ainda estão em bom estado, mas não funcionam porque a vida útil (relativamente curta) da bateria chegou ao fim ou porque o fabricante parou de fornecer suporte para o sistema operacional do aparelho? Ou ambos, provavelmente! Então, você se sente obrigado a comprar um novo. E quanto mais rápido trocamos de aparelho, mais as empresas faturam! E mais lixo eletrônico é gerado.
Acessórios incompatíveis e de uso único
Entre as práticas consideradas insustentáveis, eu concederia a “medalha de prata” para os acessórios incompatíveis e que são de uso único, como carregadores e fones de ouvido – os quais acompanham cada caixa de celular enviada ao consumidor.
A falta de compatibilidade existente entre carregadores e aparelhos de celular de fabricantes diferentes é de fato uma questão de sustentabilidade. A Wired Magazine publicou uma matéria no ano passado dizendo “haver mais de um bilhão de iPhones em todo o mundo com porta Lightning” que é incompatível com o modelo USB Tipo-C.
Tais incompatibilidades também contribuem para aumentar o lixo eletrônico, uma vez que um outro acessório acompanha o novo celular que você adquiriu. E quando o celular é de um fabricante diferente, a incompatibilidade entre os acessórios é maior ainda. Isto resulta em uma proliferação desnecessária de carregadores e acessórios, e pode exercer impactos ambientais e econômicos negativos.
Por conta dessa dificuldade, a União Europeia recentemente criou uma lei que vai exigir dos fabricantes de celular (e de outros aparelhos eletrônicos) que seus carregadores sejam padronizados a partir de 2024. Aplausos para a União Europeia!
É preciso que os fabricantes de celular também possam trabalhar no sentido de padronizar os conectores para portas de carregamento de forma a garantir um alto grau de compatibilidade entre os aparelhos, independentemente de quem os fabrica. Isso pode ajudar a minimizar a necessidade de ter cabos e conectores diferentes. A Apple recentemente lançou um carregador que é o primeiro do mundo a alimentar seis aparelhos de uma só vez.
Universalizar esses e outros acessórios permitiria que os consumidores utilizassem os antigos em seus novos telefones, resultando em menos desperdício eletrônico, além de reduzir o preço de compra do aparelho. Certamente os consumidores aprovariam essa mudança.
Incapacidade de trocar a bateria do celular
Quem não se lembra da praticidade em poder trocar a bateria do celular. Até não muito tempo atrás isso era possível em vários modelos de celular. A capacidade de remover e substituir uma bateria descarregada me faz lembrar de meu antigo celular Nokia N95 – que ainda tenho em bom estado e o uso apenas para ouvir estações de rádio FM, a fim de economizar a bateria de meu smartphone.
Comprar uma bateria nova para substituir outra que já chegou ao final de seu ciclo – e prolongar a vida útil do próprio celular – se torna menos prejudicial ao meio ambiente do que ter que comprar um novo aparelho quando a vida útil de sua bateria terminar, como é a norma vigente.
Capacidade limitada para reparos
Por último, alguns designs de telefone tornam difícil o reparo ou a substituição de seus componentes. Projetar telefones tendo em mente a capacidade de reparo é outro passo na direção certa. Portanto, caixas coladas e seladas e parafusos não padronizados dificultam a solução de problemas para os consumidores ou técnicos e, portanto, geram mais lixo eletrônico. Só nos EUA, são 20 kg de lixo eletrônico gerados per capita todos os anos, de acordo com um relatório de 2020 da ONU.
Embora as empresas estejam cientes dessas práticas ambientalmente negativas, e estejam tomando medidas para resolvê-las, ainda assim o problema existe e precisa ser levado com consideração.
Práticas consideradas positivas
Ao adotar uma série de práticas sustentáveis em seus processos de concepção e fabricação de produtos, as empresas de celular não só reduziriam seus custos de produção e sua pegada ambiental, mas também ficariam bem na foto diante de consumidores eco conscientes e se beneficiariam de uma reputação melhorada.
No momento da concepção de um novo modelo de celular, é fundamental o uso de materiais sustentáveis, incluindo – mas não se limitando a – plásticos reciclados, bioplásticos e outras possibilidades ecologicamente corretas para a armação do aparelho, seus componentes e embalagens.
Além disso, a implantação de princípios de design modular pode ser um diferencial para a indústria de telefonia celular. Ao fabricar componentes que podem ser facilmente substituídos, o design modular permite que os reparos e as atualizações dos celulares sejam mais fáceis – e se torna uma abordagem promissora para prolongar a vida útil dos aparelhos e reduzir a quantidade de lixo eletrônico produzida.
Muitos de nós sabemos que quando as empresas fabricantes de celular adotam soluções eficientes e ecológicas para suas embalagens, elas minimizam a geração de resíduos e reduzem as emissões geradas pelo transporte dos produtos.
Todavia, além da escolha certa dos materiais e da redução no desperdício de embalagens, que são aspectos críticos da sustentabilidade, os fabricantes de celular deveriam adotar um programa abrangente de reciclagem que permitisse a coleta de aparelhos antigos e danificados, com o intuito de serem descartados de forma adequada, ou consertados e vendidos novamente como recauchutados – sempre que possível.
Nesse sentido, os fabricantes de celular devem projetar seus aparelhos tendo em mente a facilidade de reparo por usuários e técnicos para que estes possam encontrar soluções para problemas comuns. Dessa forma, seria possível estender o ciclo de vida do produto, o que também pode ser alcançado se as empresas oferecerem recursos e capacidades a seus aparelhos, tornando-os úteis por mais tempo. Isso seria um incentivo para que os consumidores de seus produtos pudessem conservar seus celulares e reduzir o impacto ambiental causado pelo descarte dos mesmos por conta da obsolescência programada.
Considerações finais
O caminho para os aparelhos celulares sustentáveis é multifacetado e requer estratégias das mais variadas que, quando adotadas por seus fabricantes, podem reduzir significativamente sua pegada ambiental. Sejam elas pela adoção de materiais recicláveis e do design modular, ou mesmo pela implantação de programas de eficiência energética e de reciclagem, a jornada para celulares mais sustentáveis oferece o potencial para que a indústria possa vislumbrar um futuro com menos impacto ambiental.
Ao adotar essas estratégias, assim como muitas outras que não foram abordadas aqui, as empresas fabricantes de celular podem ser mais sustentáveis e tirar proveito dessa postura ao se alinharem com os valores de consumidores eco conscientes, os quais exigem que elas se engajem em práticas cada vez mais responsáveis e que façam produtos cada vez mais ecológicos.
Sobre o autor | Fernando Oliveira
Fernando é o fundador e editor da Sustenare News. Ele é administrador de empresas, cientista da computação e doutor em energia pela Universidade de São Paulo (USP). Fernando morou nos Estados Unidos por dez anos, país onde cursou universidade e trabalhou por igual período para empresas de tecnologia e do ramo editorial.