Em breve poderemos obter energia de usina solar espacial

Imagem de um cone espacial posicionado a certa distância da Terra com aros entre os dois ilustra artigo que diz que em breve poderemos obter energia de usina solar espacial.
Imagem artística do modelo de energia solar baseada no espaço: Cortesia da NASA.

A ideia da energia solar baseada no espaço (SBSP, da sigla em inglês) – utilizando satélites para obter a energia do sol e “transmiti-la” para pontos de recepção na Terra – existe pelo menos desde o final da década de 1960. Apesar de seu enorme potencial, o conceito não ganhou força suficiente por conta de barreiras tecnológicas e de custos.

Alguns desses problemas podem agora ser resolvidos? Se sim, a SBSP poderia se tornar uma parte vital para a transição mundial dos combustíveis fósseis para a energia verde.

Já obtemos energia do sol. Ela é obtida diretamente por meio do que geralmente chamamos de energia solar. Isso inclui tecnologias diferentes, como energia fotovoltaica (PV) e energia solar-térmica. A energia do sol também é captada de forma indireta: a energia eólica é um exemplo disso, porque as brisas são geradas pelo aquecimento desigual da atmosfera pelo sol.

Mas estas formas limpas de geração de energia têm limitações: ocupam muito espaço físico e são limitadas pela disponibilidade de luz e vento. Por exemplo, os parques solares não coletam energia à noite e coletam menos energia no inverno e em dias nublados.

A energia fotovoltaica em órbita não será limitada pelo cair da noite. Um satélite em órbita geoestacionária (GEO) – órbita circular a cerca de 36.000 km acima da Terra – está exposto ao Sol por mais de 99% do tempo durante um ano inteiro. Isso permite que ele produza energia renovável 24 horas por dia, 7 dias por semana.

Um satélite assim é ideal para quando a energia precisa ser enviada da espaçonave a um coletor de energia, ou estação terrestre, porque os satélites aqui estão estacionários em relação à Terra. Acredita-se que haja 100 vezes mais energia solar disponível na GEO do que as demandas globais estimadas de energia da humanidade até 2050.

Transferir para o solo a energia coletada no espaço requer transmissão de energia sem fio. Usar micro-ondas para isso minimiza a energia perdida na atmosfera, mesmo com o céu nublado. O feixe de micro-ondas enviado pelo satélite será direcionado para a estação terrestre, onde antenas novamente convertem as ondas eletromagnéticas em eletricidade. A estação terrestre precisará ter um diâmetro de 5 km – ou mais – em altas latitudes. No entanto, isso ainda é menor do que as áreas de terra necessárias para produzir a mesma quantidade de energia usando energia solar ou eólica.

Conceitos em evolução

Inúmeros projetos foram propostos desde o primeiro conceito de Peter Glaser em 1968.

Desenho que descreve o método de Peter Glaser baseado em satélite para converter a radiação solar em energia elétrica. Escritório de Patentes dos EUA.

Na SBSP, a energia é convertida diversas vezes (luz em eletricidade, micro-ondas em eletricidade) e parte dela é perdida na forma de calor. Para injetar na rede 2 gigawatts (GW) de energia, cerca de 10 GW de energia precisarão ser coletados pelo satélite.

Um conceito recente denominado CASSIOPeiA consiste em dois refletores dirigíveis de 2 km de largura que refletem a luz do sol em uma série de painéis solares. Esses transmissores de energia, com aproximadamente 1.700 metros de diâmetro, podem ser apontados para a estação terrestre. Estima-se que o satélite possa ter uma massa de 2.000 toneladas.

Outra arquitetura, SPS-ALPHA, difere da CASSIOPeiA porque o coletor solar é uma estrutura grande formada por uma larga quantidade de refletores pequenos e modulares chamados heliostatos, cada um podendo ser movido de forma independente e produzidos em massa para reduzir custos.

Impressão artística do conceito SPS-ALPHA. NASA/John Mankins.

Em 2023, cientistas do Caltech lançaram o MAPLE, um experimento de satélite em pequena escala que transmitiu de volta ao Caltech uma quantidade bem pequena de energia. O MAPLE provou que a tecnologia poderia ser usada para fornecer energia à Terra.

Interesse nacional e internacional

A SBSP poderia desempenhar um papel crucial para cumprir a meta de emissões net zero do Reino Unido até 2050 – mas a estratégia atual do governo não a inclui. Um estudo independente concluiu que a SBSP poderá gerar até 10 GW de eletricidade até 2050, um quarto da demanda atual do Reino Unido. A SBSP fornece um suprimento de energia seguro e estável.

A SBSP também criará uma indústria multibilionária, com 143 mil empregos em todo o país. A Agência Espacial Europeia está atualmente avaliando a viabilidade da SBSP com a sua iniciativa SOLARIS. Isto poderia ser seguido de um plano para o desenvolvimento completo da tecnologia até 2025.

Outros países anunciaram recentemente a intenção de transmitir energia para a Terra até 2025, passando para sistemas maiores nas próximas duas décadas.

Um enorme satélite

Se a tecnologia está pronta, por que a SBSP não está sendo utilizada? O principal limite é a enorme quantidade de massa que precisa ser lançada no espaço e seu custo por quilograma. Empresas como a SpaceX e a Blue Origin estão desenvolvendo veículos de lançamento de carga pesada, com foco na reutilização de suas peças depois de terem voado – o que pode reduzir o custo do empreendimento em 90%.

Mesmo usando o veículo Starship da SpaceX, que pode lançar 150 toneladas de carga na órbita baixa da Terra, o satélite SBSP exigirá centenas de lançamentos. Alguns componentes, como longas treliças – elementos estruturais projetados para cobrir longas distâncias – poderiam ser impressos em 3D no espaço.

Desafios e riscos

Uma missão SBSP será um desafio – e os riscos ainda precisam ser totalmente avaliados. Embora a eletricidade produzida seja totalmente limpa, é difícil prever o impacto da poluição de centenas de lançamentos de cargas pesadas.

Além disso, controlar uma estrutura tão grande no espaço exigirá quantidades enormes de combustível, o que inclui engenheiros trabalhando com produtos químicos por vezes muito tóxicos. Os painéis solares fotovoltaicos serão afetados pela degradação, reduzindo a eficiência ao longo do tempo entre 1–10% ao ano. No entanto, a manutenção e o reabastecimento poderiam ser usados para prolongar a vida útil do satélite quase indefinidamente.

Um feixe de micro-ondas poderoso o suficiente para atingir o solo também poderia danificar qualquer coisa que estivesse no caminho. Como uma medida de segurança, então, a densidade da potência do feixe teria que ser restrita.

O desafio de construir no espaço plataformas como esta pode parecer assustador, mas a energia solar baseada no espaço é tecnologicamente viável. Para ser economicamente viável, será preciso engenharia em grande escala e, portanto, um compromisso decisivo e de longo prazo por parte dos governos e agências espaciais.

Todavia, com tudo isso implantado, o satélite SBSP poderia dar uma contribuição fundamental para atingir a meta net zero até 2050 com [a produção de] energia limpa e sustentável a partir do espaço.

Artigo original (em inglês) publicado por Matteo Ceriotti, na The Conversation.

Sobre o autor
Matteo Ceriotti é professor sênior de Engenharia de Sistemas Espaciais na Universidade de Glasgow. Ele é mestre e doutor em engenharia espacial e autor de diversas publicações científicas em revistas internacionais. Dr. Matteo ensina controle e dinâmica de voos espaciais em cursos de Engenharia na pós-graduação.

.A Universidade de Glasgow fornece financiamento como membro do The Conversation UK.

Nota: Matteo Ceriotti não trabalha, consulta, nem possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que se beneficiaria deste artigo, e não divulgou nenhuma afiliação relevante além de sua nomeação acadêmica.

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